sábado, 6 de fevereiro de 2010

Entrevista ao Alfaiate - (2/3)



É da opinião que a estrutura e ambiente desta cidade são adequados e motivadores para estas diferenças entre os indivíduos?
Lisboa começa a ser um sítio multicultural. Temos a presença africana, brasileira e outras presenças, nomeadamente de alguns países europeus. Também noto que se está a tornar mais cosmopolita, mais turística e por isso também abordo estrangeiros. Acredito que quando as pessoas viajam/fazem turismo estão mais dispostas a fazer coisas diferentes. Quando antes disse que as pessoas de Lisboa se conheciam mais, isso está relacionado com a estrutura da cidade. Uma cidade média pode pôr barreiras, a certo ponto, porque as pessoas têm medo de aparecer em sítios que não conhecem. Agora que já há mais gente que conhece o blog, já não é tanto assim, não digo que toda a gente conheça o blog, mas penso que a resistência inicial já foi mais ultrapassada, há mais confiança no projecto do que há um ano. Eu próprio tenho mais confiança nele. Por exemplo, tiro a fotografia e já sei à partida que a pessoa vai gostar. No fundo, a estrutura da cidade são as pessoas.

Para tirar uma fotografia a estas pessoas, objectos de singularidade, o que mais o cativa desde o início? Um pormenor, o todo, a atitude durante os minutos de abordagem?
À partida quando vou pedir às pessoas para tirar a fotografia já vou com a resolução tomada. O que me chama mais a atenção é a forma como está vestida, mas sim, a atitude também. Ainda no outro dia, por exemplo, estava na Avenida da Liberdade e vejo uma rapariga a saltitar, literalmente, como a Mary Poppins, com um chapéu-de-chuva, e parecia que tinha acontecido qualquer coisa de lindo na vida dela. Desci e afinal até a conhecia. Neste caso foi a atitude que me chamou a atenção, mas em geral é o conceito estético, a forma como estão vestidos. Mas também já fotografei dois surfistas e aí a questão nem é a roupa. Aí por exemplo achei que o conceito do surfista era forte em Lisboa, numa cidade projectada no rio e voltada para o mar. São conceitos estéticos que me agradam, o limite pode ser até um penteado. O Alfaiate não é um blog de gente gira, é um blog de pessoas.

Há alguns dias, publicou um post onde afirmava ter sido contactado por marcas como a Lacoste. Como encarou este episódio?
Fiquei muito contente. Recebi um mail dum alto cargo da Lacoste onde dizia estar fascinada com o texto. Disseram que gostariam de enviar um pólo para mim e para o meu pai e fiquei muito contente, era sinal que o blog tinha ido mais longe do que aquilo que eu pensava. Há pessoas que são pagas pela Lacoste para escrever textos que incitem os consumidores e eu ali acho que me saí muito bem. Também tinha a inspiração forte que era o meu pai. Em termos de feedbacks de marcas este foi o episódio mais importante. Até porque eu nem falo muito das marcas. Já fui contactado por sites estrangeiros que me queriam associado, com a condição de falar nas marcas. Mas eu falo do que quero e do que gosto, fiz uma referência à Labrador, que é uma marca portuguesa, à Burberry, à H&M, mas quando falo das marcas é porque gosto delas. O meu interesse não é publicitá-las

Como está a lidar com o mediatismo e proporções do seu projecto? Rádio, televisão, blogosfera, pedidos de conselho acerca de moda. Num ano é um grande acontecimento.
Corre-me um certo orgulho para ser franco. Pensei em fazer uma coisa bonita. Não tinha máquina, e bolas o Zé Cabral é um Zé Ninguém. Não tinha ninguém, não tinha material. Era um anónimo que começou a fazer uma coisa que não digo que tinha tudo para dar errado, porque acho que não tinha, mas que não reunia grandes condições. Pode parecer presunçoso mas todas as coisas que aconteceram, consegui prevê-las na minha cabeça, pensei que poderiam ser possíveis. O objectivo era fazer uma coisa que eu gostasse. Quando as coisas são feitas com dedicação é mais provável que tenham qualidade. Porque é que as pessoas vão lá? As pessoas vão lá porque gostam do blogue! Ainda no fim do ano, o Pedro Rolo Duarte, supostamente um expert em blogs, que tem um programa de rádio sobre blogs na Antena 1 e todas as semanas nomeia um blog da semana, elegeu O Alfaiate Lisboeta blog do ano. Quer dizer, uma das coisas que ele faz é ver blogs, fiquei mesmo muito contente. Não é uma questão de achar que mereça ou não, mas trata-se de feedback muito positivo. É estranho tê-lo ouvido ler textos meus, é estranho ouvir alguém ler textos meus. Não me acontecia desde aquela situação da professora do 10º ano que referi no post. Bateu-me muito porque comecei do zero, sem ninguém. Tinha só um amigo que me fez o cabeçalho e a dada altura pedi a um amigo para fazer os cartões que agora entrego às pessoas, quando sugiro fotografá-las. Sinto simpatia pelo Alfaiate e para mim, ao simpatizarem com o blog, simpatizam de certo modo com o autor. Aquilo é um blog pessoal e eu estou lá, não na totalidade, mas parte de mim está lá. Resumindo, fico verdadeiramente feliz. É importante, como em todos os projectos, pois dá-me motivação para continuar.

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