sábado, 15 de janeiro de 2011

Por Manhattan - Smalls Jazz Club



Todos os miúdos irritantes têm um sonho que em nada está relacionado com a sua idade. Um dos meus era ir a Nova Iorque passar a noite num escuro clube de jazz, onde solitários e acompanhados enveredavam pelo serão até madrugada para ouvir as mais recentes vibrações de música improvisada e galopante. Este sonho não apodreceu e na visita à Big Apple, lá saímos para perto da meia-noite (e alguns desnorteios depois) encontrar o Smalls Jazz Club em West Village. A entrada é discreta, menos não se esperaria da cave mais badalada do bairro. Desde que abriu que o Smalls contraria a tendência dos seus concorrentes: em vez de se dirigir para a 2ª idade, aproveita para conquistar também a juventude eclética de Manhattan. Como? Trazendo os mais distintos tipos de músicos e estilos de jazz. Desde a bossa até ao spoken word, dos negros de 18 anos do Harlem até aos grupos mais conceituados do país no momento, este espaço de maravilhas não podia ser mais apelativo a todas as gerações. Foi tudo como sempre imaginei, um sujeito bem vestido sentado numa cadeira à porta do estabelecimento com uma caixa quadrada de lata onde guardava todos os $40 que lhe haviam sido entregues naquela noite. Quando atravessei a porta e comecei a descer as escadas, fui inundado pelo som de saxofones e do piano, no qual se insinuava o burburinho da assistência e o chocalar dos copos; o perfume das elegantes senhoras misturava-se com o cheiro doce dos licores e cocktails. Era uma das últimas noites amenas do ano, mas mesmo que não fosse o Smalls estaria cheio e sem faltar à premissa...isto porque não só de homens engravatados e mulheres com vestidos comprados na Madison Av. o público era composto. Jovens betos, jovens menos betos e jovens nada betos sentavam-se nas cadeiras, filhos educados assistiam com alegria ao concerto e conversas dos pais, pares românticos, trintões solitários, grupos de amigos com fato de trabalho, e assim continuaria a lista. O que me surpreendeu foi nada disto ser "uma salganhada". O espaço conseguia que diferentes pessoas se reunissem de uma forma mais natural que estranha, dando asas a um conforto e hospitalidade que em tudo se traduzia nas diferentes cadeiras de escritório que preenchiam a sala. Para além deste apontamento interessante, era preenchida por espelhos que permitiam ver os diversos ângulos dos músicos e os seus instrumentos (método bem mais eficaz que monitores de LCD), sofás, livros e molduras - muitas molduras -, um bar bem recheado, luzes bem laranja e fracas para criar o aconchegante ambiente. A empregada, muito jovem (teria mais de 18 anos?) tratou do simpático acolhimento e a sua atenção para com os clientes ao longo da noite quebrou quaisquer barreiras de impessoalidade que poderiam estar criadas, mesmo até para aqueles que se aventuraram sem companhia.

Assisti a dois concertos, um dado por um grupo de Upper East Side e outro por dois jovens negros da minha idade, que fizeram um jam até o sol nascer. Quando penso na afemeridade deste momento, questiono-me sobre as várias formas como podia voltar, mas nunca seria o mesmo. O primeiro impacto sobre o sonho de um miúdo fê-lo tomar consciência de que, embora num contexto onde a juventude era mais que bem-vinda, tinha crescido. E da melhor maneira.

183 West 10th street
New York City, N.Y. 10014

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